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Em Rio, 40 Graus, Nelson Pereira dos Santos nos presenteia com um retrato multifacetado da cidade do Rio de Janeiro, onde a câmera, com fluidez e precisão, nos guia através de um mosaico de vidas entrelaçadas pela geografia e pela experiência humana. É fascinante como Nelson transforma o Rio de Janeiro em um personagem complexo, onde cada canto conta uma história, cada esquina guarda seus temores e alegrias, mas, no fim, todos são unidos pela brasilidade.
Desde os primeiros minutos, somos lançados em um turbilhão de histórias que se desenrolam simultaneamente, cada uma carregando sua própria carga emocional e social. A narrativa se fragmenta em múltiplos pontos de vista, revelando a diversidade e a desigualdade que coexistem na metrópole carioca. A montagem é uma dança sincronizada, habilmente coreografada para garantir que cada personagem e seu respectivo momento narrativo recebam o tempo e o espaço necessários para existirem. Nelson aponta a câmera para diferentes pessoas, trazendo à tona seus problemas e resolvendo tão poucos deles, porque Rio, 40 Graus trata-se de um relato do dia a dia de uma cidade tão diversa. Ou seja, Nelson não se preocupa em contar começo, meio e fim de cada pessoa; ele quer apenas mostrar que elas estão ali, espalhadas por todo o Brasil.
Gosto de como a câmera de Nelson Pereira dos Santos parece seguir as pessoas como se procurasse histórias que lhe interessassem, assumindo uma posição voyeurística compassiva, que não apenas observa, mas também se envolve profundamente com seus sujeitos. Vemos o deputado rico, encapsulado em sua bolha de privilégio; a mulher que deseja ser amada; o homem que não quer assumir um filho; e o garoto da favela, cuja existência é marcada pela luta constante pela sobrevivência.
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Também vemos o atleta de futebol mergulhado em melancolia e insegurança e a disputa de um homem pela mão de uma mulher. Nelson vai e vem entre essas narrativas, mostrando a dicotomia entre essas vidas. Embora unidas pela mesma cidade, ele destaca o abismo social que separa os mundos dentro do Rio de Janeiro. É um choque de realidades que se desenrola diante de nossos olhos, provocando uma reflexão sobre a natureza da justiça social e a persistência da desigualdade. Um reflexo não apenas de uma cidade, mas de um país que acolhe os turistas e sucateia seus trabalhadores.
A montagem é fundamental para o dinamismo de Rio, 40 Graus. O ritmo e o tempo que Santos nos permite ver e ouvir são fantásticos; o tempo é o testemunho da ação, criando elos entre as personas, seja por uma mesma rua, pelo jogo que acontece no Maracanã ou pelo calor que permeia a cidade. Essas vidas estão entrelaçadas como uma teia de aranha, por mais diferentes que sejam. É uma união poética onde a decupagem assume o protagonismo. É na maneira como a câmera se movimenta, contempla e ouvi, que mantém o espectador envolvido do começo ao fim.
Rio, 40 Graus é a brasilidade filmada, onde o samba e o futebol servem como a pulsação que reflete o espírito vibrante de uma nação. Embora o Brasil seja muito mais do que isso, aqui, essas particularidades tão brasileiras se tornam o grande equalizador: é naquele estádio histórico que pobres e ricos se tornam iguais, sentados nos mesmos lugares, torcendo pelo mesmo time. É na roda de samba que os conflitos se cessam e a confraternização emerge. Nelson Pereira dos Santos capta essa essência, mostrando como, apesar das profundas desigualdades, há momentos e espaços onde a brasilidade une a todos em uma celebração comum.