[ad_1]
A emergência de uma nova variante do coronavírus representa preocupação diante da possibilidade de novas ondas da Covid-19, de impactos para as vacinas e testes de diagnóstico disponíveis, e riscos de aumento da gravidade da doença.
Desde 11 de janeiro de 2020, quando o código genético do SARS-CoV-2 se tornou conhecido, linhagens e variantes do vírus passaram a ser amplamente monitoradas e estudadas pela comunidade científica global.
Atualmente, a variante XBB.1.5, um recombinante das sublinhagens BA.2.10.1 e BA.2.75, ambas da variante Ômicron, tem sido associada ao aumento significativo de casos de Covid-19 nos Estados Unidos. Considerada altamente transmissível, a linhagem foi detectada pela primeira vez no Brasil recentemente.
Vírus são microrganismos com estruturas relativamente simples, compostos basicamente de proteínas e de informações genéticas. Essa característica faz com que eles tenham uma alta capacidade de mutação.
Faz parte do processo natural de evolução do SARS-CoV-2 adquirir novas mutações para se adaptar à população. Enquanto o vírus circular em altas proporções, existe a possibilidade de surgimento de novas variantes. Por isso, o ideal é que a gente reduza ao máximo essa circulação, para que as chances de surgimento de uma nova variante, que pode ter maior impacto na dispersão da Covid-19, seja reduzida
Paola Resende, pesquisadora da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz)
Especialistas em virologia afirmam ser difícil prever o surgimento de novas variantes. No entanto, o fenômeno ganha impulso com o aumento da circulação viral. Embora algumas mutações não representem qualquer tipo de alteração nas características virais, outras podem conferir vantagens como o aumento da transmissibilidade.
A pesquisadora Paola Resende, do Laboratório de Vírus Respiratórios e do Sarampo do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz), explica que nem todas as variantes são preocupantes.
“Todas as variantes são monitoradas, mas temos diferentes classificações de variantes, dependendo do impacto global ou regional. As variantes de preocupação são aquelas que se expandiram globalmente. As variantes Alfa, Beta, Delta e Gama circularam no passado. Atualmente, a Ômicron predomina em todo o mundo. Nós já tivemos também variantes de interesse, como foi o caso da Zeta no Brasil. Estas variantes foram monitoradas, mas tiveram impacto menor do que as variantes de preocupação e já deixaram de circular”, afirma Paola, uma das curadoras da plataforma Gisaid, o principal banco de dados genéticos do coronavírus do mundo.
Monitoramento
De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), o vírus SARS-CoV-2, causador da Covid-19, continua a evoluir. No início de janeiro, a instituição divulgou um comunicado afirmando que, após reunião com a China realizada em dezembro, não foi identificada nenhuma nova variante do coronavírus.
A escalada no número de casos no país asiático motivou o encontro entre especialistas da OMS, da Comissão Nacional de Saúde da China e da Administração Nacional de Controle e Prevenção de Doenças. Após o encontro, o Grupo Consultivo Técnico sobre Evolução do Vírus SARS-CoV-2 (TAG-VE, em inglês) reforçou a necessidade crítica de mais dados sobre os vírus em circulação na China.
Nesta quarta-feira (11), o grupo que assessora a OMS informou a avaliação de risco sobre a subvariante XBB.1.5 é baixa. No entanto, há possibilidade de um aumento na incidência de casos de Covid-19 a nível global devido à circulação da subvariante.
Única brasileira no grupo, que reúne 25 especialistas, a chefe do Laboratório de Vírus Respiratórios e do Sarampo da Fiocruz, Marilda Siqueira, ressalta que ampliar a cobertura vacinal, usar máscaras e manter a vigilância são as principais recomendações nesse momento.
“Temos dois cenários que requerem maior atenção e que foram discutidos na primeira reunião do ano: a disseminação, nos Estados Unidos e em outros países, da variante XBB.1.5, que é altamente transmissível, e a escalada de casos na China, onde vemos possível subnotificação e baixo número de sequenciamentos genéticos”, diz Marilda.
A sublinhagem está associada a um rápido crescimento do número de casos. Nos Estados Unidos, em novembro, cerca 4% das linhagens detectadas eram XBB.1.5. No final de dezembro, o índice já estava em 41%, afirma Marilda.
“As autoridades americanas também relataram aumento do número de internações. Em testes em laboratório, essa linhagem apresentou menor chance de ser neutralizada por anticorpos do que outras subvariantes da Ômicron, como BA.2, BA.4 e BA.5, que tiveram grande circulação. Porém, isso não significa que ela vai ser mais grave. É uma situação que estamos acompanhando”, detalha.
Na semana passada, cientistas identificaram o primeiro caso de Covid-19 no Brasil causado pela variante XBB.1.5. O caso confirmado pela Rede Dasa é de uma paciente de 54 anos de Indaiatuba, no interior de São Paulo.
A pesquisadora da Fiocruz afirma ser difícil prever o impacto da circulação da linhagem no país, mas enfatiza a necessidade de ampliação da cobertura vacinal e da adoção de medidas de prevenção.
É muito difícil anteciparmos qual pode ser o tamanho de uma nova onda. Temos uma população vacinada, mas precisamos melhorar a taxa de reforço. Isso é muito importante para todos os grupos: tanto populações vulneráveis, como idosos e portadores de doenças crônicas, quanto adultos e jovens, que ainda têm baixa taxa de reforço. Também precisamos reforçar o uso de máscaras em locais fechados, em aglomerações e em contato com pessoas vulneráveis, como ocorre em hospitais, clínicas e asilos
Marilda Siqueira, virologista da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz)
Linhagens e variantes
A pesquisadora Paola Resende explica que grande parte das variantes que têm surgido recentemente são derivadas da Ômicron.
“Quando a Ômicron foi introduzida no Brasil, as sublinhagens predominantes eram BA.1 e BA.2. Ao longo do tempo, elas foram sendo substituídas por BA.4 e BA.5. Hoje, temos algumas linhagens que a Organização Mundial da Saúde classifica como subvariantes da Ômicron sob monitoramento, que devem ser acompanhadas com atenção porque podem ter maior impacto na circulação da Covid-19. Nesse grupo, temos, por exemplo, a subvariante XBB e suas linhagens, incluindo a XBB.1.5”, detalha.
Variantes e linhagens são classificações dos vírus. Para padronizar a classificação do SARS-CoV-2, foi estabelecido um sistema chamado de Pangolin. O sistema considera a presença de mutações pontuais ao longo do genoma, que são compartilhadas por vários vírus e são consideradas como assinaturas genéticas.
“Já foram descritas mais de 2.500 linhagens do SARS-CoV-2. Entretanto, nem todas essas linhagens tiveram sucesso evolutivo. Nem todas conseguiram se dispersar por diferentes localidades ou diferentes países, e muitas delas já deixaram de circular. Hoje, apenas algumas dessas 2.500 linhagens circulam, porque o padrão é uma linhagem substituir a outra ao longo do tempo”, afirma Paola.
Entre essas linhagens, algumas delas se destacam epidemiologicamente, pelo número de casos ou por terem mutações importantes ao longo do genoma. Para essas linhagens que se destacam, a OMS determinou um sistema de classificação de variantes, que são identificadas por letras do alfabeto grego.
“Todos os casos sequenciados no Brasil são da variante Ômicron. Entre as subvariantes, a maior parte das linhagens sequenciadas em dezembro foi de BQ.1.1, com 58 genomas (50% do total), e BQ.1, com 24 genomas (21% do total). Ambas são sublinhagens de BA.5 que estão sob monitoramento porque possuem mutações adicionais no genoma. Também houve detecção de BA.5, com 11 genomas (quase 10% do total)”, afirma Paola.
Desde o começo da pandemia, a Rede Genômica Fiocruz sequenciou mais de 68 mil genomas do coronavírus, sendo cerca de 30 mil decodificados pelo Laboratório de Vírus Respiratórios e do Sarampo do IOC/Fiocruz.
“De novembro para cá, detectamos 487 casos de BA.5 e 1.189 casos de sublinhagens de BA.5, incluindo BQ.1.1, BQ.1 e BF.7, que são subvariantes sob monitoramento. Além disso, identificamos 74 casos de BA.4.6 e 18 casos de XBB. Ambas também são subvariantes sob monitoramento”.
A notificação das novas linhagens detectadas no país é feita diretamente ao Ministério da Saúde, às secretarias estaduais de Saúde e Laboratórios Centrais de Saúde Pública (Laces). Dentro do Ministério da Saúde, dois órgãos são notificados: a Coordenação Geral de Laboratórios (CGLab) e a Coordenação Geral da Gripe (CGGripe), que coordenam o monitoramento dessas variantes no país.
“Essa notificação é feita imediatamente após o sequenciamento genômico e análise dos dados. Além disso, nós depositamos as sequências genéticas decodificadas no banco de dados da plataforma internacional Gisaid, para compartilhamento de informações com a comunidade científica”, explica.
Compartilhe: